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Em setembro, o Tribunal Superior do Trabalho promoveu uma das mudanças mais relevantes dos últimos anos na forma de tributação dos acordos trabalhistas. Ao julgar o Tema 310 em Incidente de Recursos Repetitivos (IRR), a Corte estabeleceu, com efeito vinculante, que há incidência de contribuição previdenciária sobre todo valor pago em acordos homologados judicialmente, mesmo quando não há reconhecimento de vínculo de emprego.
A decisão consolida de maneira definitiva o entendimento já previsto na OJ 398 da SDI-1, que agora passa a ser observada obrigatoriamente por todos os Tribunais Regionais do Trabalho.
Por que o TST firmou essa tese?
O fundamento central da decisão é que a natureza jurídica da verba decorre da realidade econômica, e não da nomenclatura atribuída no acordo.
Assim, ainda que as partes tentem classificar o valor pactuado como “indenização civil”, a prestação de serviços sem vínculo formal configura hipótese de contribuição previdenciária, nos termos:
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do art. 22, III, da Lei 8.212/91 (contribuição patronal – 20%);
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do art. 30, §4º, da Lei 8.212/91 (retenção de 11% do contribuinte individual).
Ou seja: a forma como o valor é descrito não altera o fato gerador.
Impacto direto nas negociações judiciais
Até então, era comum que empresas e trabalhadores atribuissem natureza indenizatória ao acordo para reduzir os encargos. Com a tese vinculante, essa estratégia não é mais possível.
Agora, todo acordo sem vínculo deve observar:
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20% – contribuição previdenciária da empresa tomadora;
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11% – contribuição previdenciária do trabalhador (contribuinte individual);
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Base de cálculo: valor total ajustado, respeitado o teto.
A carga previdenciária agregada chega, portanto, a 31%.
Essa mudança obriga empresas a rever modelos de negociação, recalcular provisões e ajustar estratégias de composição para evitar custos ocultos e passivos futuros.
Exemplo prático
📌 Acordo de R$ 50.000
1) Se os R$ 50 mil forem líquidos para o trabalhador:
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Empresa paga os R$ 50 mil + 20% (R$ 10 mil).
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O trabalhador recebe R$ 50 mil, mas a empresa recolhe por ele os 11% ao INSS.
Custo total da empresa: R$ 60 mil, além dos 11% descontados do trabalhador.
2) Se os R$ 50 mil forem o valor bruto:
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Empresa recolhe 20% (R$ 10 mil).
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Trabalhador recebe R$ 44,5 mil (50 mil – 11%).
Em ambos os cenários, a carga previdenciária total permanece em 31%.
Por isso, deixar de planejar o custo global pode gerar distorções financeiras, litígios ou até execuções fiscais.
Reforço da fiscalização: TRTs já aplicam prazos e sanções
O novo entendimento já está sendo replicado na prática. Tribunais como o da 2ª e da 15ª regiões vêm determinando que as partes comprovem o recolhimento previdenciário dentro de prazo fixado, sob pena de execução imediata.
Isso evidencia a força vinculante da tese e o esforço do Judiciário em coibir acordos estruturados apenas para evitar contribuições.
E quando existe vínculo de emprego reconhecido?
Quando já há vínculo empregatício formal ou reconhecido em outro processo — mesmo que a empresa figure apenas como responsável subsidiária — o tema não altera a sistemática de recolhimento:
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as rubricas salariais já geram, por si só, contribuição previdenciária;
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as parcelas indenizatórias permanecem excluídas.
O impacto maior recai sobre acordos celebrados sem vínculo.
Consequências estratégicas para empresas
A partir de agora, empresas devem:
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incluir o custo previdenciário no cálculo inicial do acordo;
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definir se o valor será bruto ou líquido;
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prever recursos para recolhimentos imediatos;
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evitar acordos “totalmente indenizatórios”;
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revisar políticas internas de gestão de passivos;
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reavaliar estratégias em processos repetitivos ou de alto valor;
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construir governança jurídica alinhada ao novo cenário.
Em alguns casos, pode até ser mais vantajoso reconhecer parcialmente o vínculo para estruturar melhor as verbas e separar componentes indenizatórios legítimos.
Possível debate futuro no STF
Embora o precedente do TST tenha efeito obrigatório, não se descarta futura discussão constitucional, especialmente quando a cobrança recair sobre:
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valores efetivamente reparatórios;
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verbas sem relação direta com prestação de serviços;
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acordos que visem encerrar apenas litígios civis acessórios.
Poderão surgir questionamentos sobre:
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o princípio da legalidade tributária;
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o conceito constitucional de fato gerador das contribuições sociais.
Até que isso ocorra, porém, a regra é clara e deve ser cumprida.
Conclusão
O Tema 310 do TST transformou a forma como empresas e trabalhadores devem tratar acordos judiciais sem vínculo de emprego. A partir de agora:
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não importa o nome da verba;
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não importa se o acordo diz ser “indenizatório”;
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incide contribuição previdenciária sobre todo o valor pactuado.
A medida dá uniformidade às decisões, combate práticas evasivas e reforça a transparência. Mas também eleva os custos empresariais, encurta margens de negociação e impõe um novo padrão de planejamento jurídico e financeiro.
Empresas que não se adaptarem podem enfrentar aumento expressivo de passivos, execuções fiscais e insegurança operacional.
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