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Economia legal, recuperação de tributos e planejamento estratégico fiscal para clínicas de saúde com a Equiparação Hospitalar.
Você dirige uma clínica médica, odontológica, de fisioterapia ou outro serviço de saúde, e sente que a carga tributária pesa demais? E se existisse uma forma legal de reduzir substancialmente o que se paga de IRPJ e CSLL, mantendo tudo dentro da lei? É exatamente disso que trata a equiparação hospitalar — uma oportunidade consolidada por lei e jurisprudência (como o Tema 217 do STJ) que permite que certas clínicas optantes do lucro presumido paguem sobre bases muito menores.
Neste artigo, você vai entender:
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O que é equiparação hospitalar e sua base legal
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Quem tem direito e quais são os requisitos imprescindíveis
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Como aplicar na prática (administrativa vs judicial)
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Exemplos de economia real
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Cuidados que devem ser tomados para evitar riscos
O que é equiparação hospitalar no regime do Lucro Presumido
A equiparação hospitalar é um benefício previsto na Lei nº 9.249/1995, que permite que clínicas e serviços de saúde que cumpram determinados requisitos possam reduzir a base de cálculo de presunção para o IRPJ e a CSLL quando optam pelo regime de lucro presumido.
Normalmente, prestadores de serviços tributados pelo lucro presumido usam uma presunção de 32% do faturamento para calcular IRPJ e CSLL. Porém, para os serviços que se equiparam a hospitalares, essa base pode cair para 8% no IRPJ e 12% na CSLL. Isso representa uma redução expressiva na incidência desses tributos.
Jurisprudência atual: Tema 217 do STJ
O Tema 217 dos recursos repetitivos do STJ consolidou esse entendimento: clínicas que prestam serviços de saúde com estrutura compatível e atividades mais complexas, embora não sejam hospitais propriamente ditos, podem ser tratadas como hospitalares para fins tributários, desde que preencham os requisitos legais.
Esse precedente torna a tese vinculante para decisões inferiores, o que dá maior segurança jurídica para quem decidir buscar esse benefício.
Quem pode se beneficiar: requisitos legais e operacionais
Para que a clínica tenha direito ao benefício da equiparação hospitalar, precisa atender cumulativamente os seguintes requisitos:
Requisito | O que significa na prática |
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Regime de Lucro Presumido | A clínica deve estar formalmente optante por esse regime. O benefício não se aplica ao Simples Nacional nem ao Lucro Real. |
Sociedade empresária, de direito e de fato | Deve haver constituição adequada (registro na Junta Comercial), objeto social empresarial, atuação como empresa (equipe, suporte administrativo). Clínicas que operam como sociedades simples ou muito centradas em sócios individuais têm dificuldade de enquadramento. |
Licença sanitária válida / autorizações sanitárias (Anvisa ou órgão local) | A clínica precisa possuir licença ou alvará com atividades compatíveis com os serviços que pretende equiparar, estar dentro da validade, descrever corretamente os procedimentos autorizados etc. |
Serviços de saúde que promovam a saúde do paciente de forma complexa | Não basta emitir consultas simples: precisam ser serviços com grau técnico relevante — exames, diagnósticos, terapias, procedimentos invasivos, cirurgias ambulatoriais, centro de imagem etc. A natureza do serviço precisa estar bem caracterizada. |
Além desses, é importante que CNAE, objeto social da empresa, notas fiscais, estrutura física, equipe técnica e demais documentos sejam coerentes com o que está exercido na prática. Discrepâncias entre o que consta formalmente e o que é realizado podem causar indeferimento ou autuação.
Como aplicar na prática: administrativa vs judicial
Via administrativa (contábil/documental)
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Pode ser feita direto pela contabilidade, ajustando a presunção de forma retroativa, se houver segurança de que todos os documentos e requisitos foram cumpridos.
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Mais rápida e menos onerosa do que um processo judicial.
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Entretanto, apresenta risco: a Receita Federal ou fiscalização podem questionar, exigir provas adicionais, negar o pedido retroativamente ou impor multa.
Via judicial
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É recomendada sobretudo quando há dúvida sobre algum requisito (CNAE, licença, objeto social, estrutura física), ou quando se pretende garantir a recuperação de tributos pagos indevidamente nos últimos 5 anos.
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A decisão judicial com base no Tema 217 oferece respaldo legal forte, inclusive para autorizações de compensação administrativa (via PER/DCOMP) sem risco de glosa.
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Desvantagens: demora, custo de processo e necessidade de provas robustas.
Exemplo de economia real
Vamos a um cenário prático para ilustrar o impacto:
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Faturamento mensal da clínica: R$ 100.000
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Sem equiparação: presunção de 32% → base de cálculo = R$ 32.000
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Com equiparação: presunção de 8% para IRPJ e 12% para CSLL → base de cálculo = R$ 8.000 (IRPJ) + R$ 12.000 (CSLL) → R$ 20.000 totais para os dois tributos
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Comparando: de R$ 32.000 para R$ 20.000 → economia na base de cálculo de ~37,5%. Mas considerando as alíquotas aplicáveis de IRPJ/CSLL, essa redução pode se traduzir numa economia de até ~70% nesses dois tributos, dependendo da empresa.
Também há a possibilidade de restituição ou compensação dos valores pagos indevidamente nos últimos 5 anos, desde que comprovados todos os requisitos nesse período — o que pode gerar impacto financeiro muito relevante no caixa da clínica.
Cuidados e riscos que devem ser observados
Para não correr riscos de problemas fiscais, autuações ou indeferimentos:
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Regularidade documental: contratos sociais, objeto social, licenças sanitárias, CNAE, notas fiscais devem estar em ordem, coerentes e atualizados.
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Descrever com precisão os serviços: evitar descrições genéricas. Em notas fiscais, contratos, objetos sociais, especificar procedimentos, especialidades, exames etc.
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Licença sanitária em vigor: licença vencida ou insuficiente pode inviabilizar.
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Estrutura empresarial real: equipe, equipamentos, suporte administrativo — não basta formalidade; a prática deve demonstrar que a empresa atua como sociedade empresarial.
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Evitar atuação puramente consultiva ou estética: procedimentos estéticos ou de baixa complexidade, consultas isoladas ou sem requisitos técnicos são geralmente recusados.
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Parecer jurídico especializado: antes de implementar mudanças significativas.
Conclusão
A equiparação hospitalar representa uma alternativa poderosa, legítima e legal para clínicas optantes do lucro presumido que desejam reduzir com segurança a carga de IRPJ e CSLL, recuperar tributos pagos indevidamente e melhorar o fluxo de caixa. Com respaldo no Tema 217 do STJ, esse benefício exige, porém, que todos os requisitos sejam cumpridos de forma sólida, tanto documental quanto operacionalmente.
Se você atua no setor de saúde, o próximo passo é fazer um diagnóstico tributário da sua clínica: verificar CNAE, objeto social, licenças sanitárias, estrutura física e documentação. Consulte seu contador e, se necessário, advogados tributários especializados, para avaliar qual caminho (administrativo ou judicial) se adequa ao seu caso.
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