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Com a Emenda Constitucional 132/2023, o Brasil se prepara para um novo cenário tributário. Entenda as mudanças no Simples Nacional e as escolhas cruciais para sua empresa.
A Reforma Tributária, aprovada no final de 2023 com a Emenda Constitucional 132, marca uma virada histórica no sistema de tributação sobre o consumo no Brasil. As mudanças, que se desenrolarão até 2033, exigem que micro e pequenas empresas, especialmente as optantes pelo Simples Nacional, comecem a planejar suas estratégias desde já.
O ano de 2026 será um período crucial de adaptação e simulação, onde as empresas precisarão avaliar cuidadosamente os impactos dos novos Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) em suas operações.
Este guia essencial detalha as principais alterações para o Simples Nacional, as opções disponíveis e os fatores determinantes para as decisões que sua empresa precisará tomar nos próximos meses, conforme informações detalhadas pela Dra. Flávia Gaeta.
A Nova Estrutura Tributária Brasileira e o Fim de Antigos Impostos
A Emenda Constitucional 132/2023 promove uma reestruturação profunda, eliminando progressivamente tributos como ICMS, ISS, PIS e COFINS. No lugar dessas quatro espécies tributárias, que hoje atuam nos âmbitos estadual, municipal e federal, surgem a CBS, de competência da União, e o IBS, com uma inédita competência compartilhada entre estados e municípios.
Essa nova dinâmica de competência compartilhada é um instituto inovador que promete modificar não apenas a arrecadação, mas também os processos de fiscalização e o contencioso administrativo e judicial, exigindo uma adaptação de toda a estrutura jurídica tributária.
A reforma também introduz uma tributação de base ampla, eliminando a distinção entre comércio e serviço. Todos que fornecem bens materiais, imateriais, serviços ou direitos dentro da cadeia de consumo serão tributados de maneira idêntica. Essa uniformização poderá prejudicar significativamente o setor de serviços, que hoje tem alíquotas de ISS limitadas a 5% e verá um aumento substancial da carga tributária com o IBS e a CBS.
Simples Nacional: Um Regime Fragmentado e as Novas Opções para 2026
O Simples Nacional é um regime simplificado de tributação de grande relevância econômica, abrangendo entre 75% e 90% das empresas formais no Brasil, incluindo microempreendedores individuais. Atualmente, ele unifica o recolhimento de diversos tributos, como Imposto de Renda, CSLL, PIS, COFINS, ICMS e ISS, em uma única guia.
Com a reforma, o artigo 146 da Constituição Federal, alterado pela EC 132, prevê um tratamento diferenciado e favorecido para microempresas e empresas de pequeno porte. No entanto, a grande mudança para os optantes do Simples Nacional é a facultatividade de como recolher o IBS e a CBS.
A empresa poderá escolher entre duas opções: continuar no regime único do Simples Nacional, recolhendo IBS e CBS internamente, sem tomar crédito e repassando crédito ao cliente apenas na proporção do que foi pago. Ou, alternativamente, optar por recolher Imposto de Renda, CSLL e Contribuição Previdenciária Patronal pelo regime único, mas apurar e recolher IBS e CBS de forma segregada, seguindo as regras do regime regular, com alíquota cheia, tomando todos os créditos e repassando o crédito integral para a etapa subsequente.
A escolha pelo regime segregado de IBS/CBS, embora permita o aproveitamento de créditos, pode não ser vantajosa para todos, especialmente para prestadores de serviços, que geralmente têm seus maiores custos vinculados à folha de salários, despesa que não gera crédito de IBS/CBS. A maior parte das despesas operacionais, como energia e materiais, representa uma proporção pequena em relação às receitas.
É fundamental lembrar que a natureza facultativa do Simples Nacional implica que a avaliação sobre sua vantagem ou desvantagem é do próprio contribuinte. Uma vez feita a opção, não será possível contestar judicialmente a onerosidade do regime, pois a escolha foi individual, um princípio já estabelecido em outros regimes como o Lucro Presumido e a CPRB.
Decisões Estratégicas para sua Empresa: Custos, Clientes e o Ano de Teste
Para tomar a melhor decisão sobre o futuro tributário de sua empresa no Simples Nacional, dois fatores são cruciais: o volume de despesas com direito a crédito de IBS e CBS e o perfil de seus clientes. A análise dos custos e despesas que geram crédito é vital para determinar se a apuração segregada do IBS/CBS será benéfica.
Além disso, a sua posição na cadeia econômica e quem são seus clientes é determinante. Se a maioria de seus clientes também for optante pelo Simples Nacional e não tiver interesse em tomar crédito, permanecer no regime único para IBS/CBS pode ser a opção mais simples. No entanto, se seus clientes forem empresas de lucro real, que tomam crédito, eles provavelmente desejarão receber notas fiscais com crédito integral, direcionando sua escolha para a apuração segregada.
O ano de 2026 será um período de teste, onde as empresas não optantes pelo Simples Nacional já farão simulações e cumprirão obrigações acessórias relacionadas ao IBS e CBS. Para os optantes do Simples Nacional, este é o momento de conversar com os clientes e fornecedores para entender suas expectativas e alinhar as estratégias. A opção pelo regime é anual, portanto, uma decisão equivocada pode impactar um ano calendário inteiro.
A Lei Complementar 214 e os Futuros do Simples Nacional
A Lei Complementar 214/2023, em seu artigo 41, já traz a regulamentação do regime de apuração para as novas espécies tributárias. Mais importante ainda, seus anexos detalham as proporções das alíquotas e a progressão da carga tributária de 2027 a 2033, mostrando como as alíquotas máximas e mínimas serão ajustadas conforme ICMS, ISS, PIS e COFINS são eliminados.
A LC 214 também prevê a repartição dos tributos dentro do Simples Nacional, indicando a fatia que caberá ao Imposto de Renda, CSLL, CBS, Contribuição Previdenciária Patronal, ICMS e IBS. Essa previsão permite uma análise antecipada dos impactos sobre cada tipo de atividade e faixa de faturamento.
Atualmente, o sublimite do Simples Nacional é de R$3,6 milhões e o limite total é de R$4,8 milhões. Há projetos de lei em andamento para elevar o limite para cerca de R$8,6 milhões. Caso aprovado, esse aumento pode expandir ainda mais a parcela de empresas enquadradas no regime, podendo atingir quase 90% do total de empresas formais, embora essas representem apenas cerca de 30% do PIB nacional.
Diante de tantas mudanças, é imperativo que as empresas e seus assessores contábeis e jurídicos se aprofundem na Reforma Tributária e no impacto específico sobre o Simples Nacional. Procrastinar essa análise pode levar a decisões financeiras equivocadas e perdas significativas no futuro.